"Nadie enseña a nadie, con humildad para aprender, tod@s aprendemos de tod@s"
CONSTRUINDO A IGUALDADE DE GÊNERO
PROGRAMA MULHER E CIÊNCIA
RESUMO
UM ENSAIO SOBRE O PODER A VIOLÊNCIA E AS MULHERES
2010
AUTORA: Liz Helena Pigatto[1]
ORIENTADORA: Lisete Maria Massulini Pigatto[2]
Este trabalho foi realizado na Cátedra de Gênero Wilma Roberts situado e localizado na Faculdade Metodista do Sul, na Cidade de Santa Maria, RS. Organizado pela Advogada Liz Helena Pigatto e orientada pela Drª em Ciências da Educação Lisete Maria Massulini Pigatto. Este artigo analisa as relações de poder e a violência contra a mulher desde os primórdios dos tempos até a conquista da cidadania no século XXI. Fundamenta-se em diversos autores e justifica-se pela necessidade em conscientizar as pessoas sobre a importância da cidadania na vida do ser humano. Sejam homens ou mulheres, ricos ou pobres, negros ou brancos, ateus ou não, o direito a liberdade de expressão é de fundamental importância para que consigam viver e conviver de uma forma saudável. Neste contexto marcado pela violência, percebe-se que é preciso divulgar estas idéias sobre a questão de gênero, escrever e promover a reflexão sobre o tema com acessibilidade na diversidade. Favorecer informações e conhecimentos que induzam as pessoas a pensar sobre a existência, motivá-las a construir saberes para que possam melhorar-se como seres humanos, pois a violência é uma forma de poder, uma manifestação repugnante onde às mulheres são sempre as maiores vítimas, humilhadas e desvalorizadas. O artigo segue as normas da ABNT (2005), utiliza como metodologia a investigação-ação, fundamentada em Carr y Kemmis (1988). O método contempla um conjunto de regras e procedimentos que possibilitam realizar uma pesquisa de forma livre e continuada gerando constantemente novas perguntas e a possibilidade de dar sequência a investigação de forma curiosa e inovadora. No paradigma inclusivo aprender a aprender torna-se uma necessidade educacional e socioeconômica para que as pessoas aprendam a viver e a conviver em harmonia, respeitando as suas idéias e crenças. Neste processo aprender a aprender gera uma ansiedade natural nas pessoas e muitas vezes uma sensação de impotência, para isso precisamos estimulá-las para que aprendam a lidar com estas situações de desconforto, superando-se. No intuito de transformar o sofrimento do aprender em prazer é que trabalha-se de forma lúdica recreativa e sistematizada, lançando a seguinte questão: - A violência contra a mulher é um problema contextual ou o resultado de um processo sócio-histórico-cultural? A investigação tem como objetivo instigar a pensar sobre a influência do poder na violência contra as mulheres. Da antiguidade até os dias atuais a uma relação dicotômica entre o poder e a mulher, onde ambos despertam interesses e desejo de posse ao homem. Uma manifestação típica do poder patriarcal, conscientemente identificado e legalmente instituído em muitas sociedades ao longo na historia da humanidade para garantir a permanência do poder político nas mãos do gênero masculino. Uma visão que pela ascensão da democracia vem sendo derrubada, garantindo auto-estima e direitos políticos às mulheres. A historia demonstra que a instauração do patriarcado iniciou-se aproximadamente pelo ano 3100 a.c. e teve a sua consolidação efetiva no ano 600 a.c. colocando a mulher sempre em segundo plano. À medida que a sociedade evoluiu, deixando a vida isolada de clãs e tribos nômades para compartilhar terras, crenças e costumes, formando cidades, gradativamente precisaram organizar-se para administrar a coletividade. Deste modo a força e a barbárie foram sendo substituídas pelas decisões tomadas pelas lideranças na comunidade, que associavam idéias para poder sobreviver. No século XX as mulheres já conseguiram avanços significativos e daqui para frente pretende-se emponderá-las com saberes para que percam o medo do poder e assumam as lideranças na família, na comunidade, na política, nas empresas e na sociedade.
Palavras-chaves: poder, mulheres, formação social e cidadania.
Santa Maria - RS
2010
INTRODUÇÃO
O folclore popular conta que certa vez um jovem vassalo recebeu do rei uma importante missão que consistia em levar uma mensagem secreta e alguns diamantes ao seu amigo, um rei que morava em terras longínquas, no norte do planeta terra.
Para cumprir a tarefa recebeu o melhor cavalo do reino e alguns mantimentos.
Ao despedir-se do vassalo o rei disse-lhe:
- Cuida do mais importante e cumprirás a tua missão com êxito.
Na noite anterior o jovem vassalo preparou o seu alforje, escondeu a mensagem na bainha da calça e colocou as pedras numa bolsa de couro amarrada na cintura por baixo das vestes e antes de clarear o dia sumiu no horizonte com destino ao seu objetivo.
Viril e corajoso queria que o reino soubesse das suas qualidades e que encontrava-se em condições para desposar a linda princesa. Para cumprir a missão com mais rapidez deixava a estrada principal com freqüência e pegava atalhos perigosos que prejudicavam a montaria, exigindo muito do animal que começava a sentir no lombo o cansaço e os maus tratos.
Quando parava numa estalagem, deixava o cavalo ao relento, não tirava a sela e nem a carga e nem ao menos preocupava-se em dar-lhe de comer e beber. Alertado sobre as condições do animal, o jovem respondia que não importava-se com o cavalo pois tinha algo mais importante a fazer e qualquer eventualidade compraria um outro ser movente.
Com o passar dos dias e sob tamanho esforço, o pobre animal não suportou mais a judiaria e caiu morto na estrada. O jovem o amaldiçoou e seguiu a pé na intenção de comprar outro cavalo, mas como a região era íngreme e havia poucos feudos, teve que caminhar muitas e muitas léguas a pé sem conseguir nada, só então percebeu a falta que fazia o animal.
Exausto e sedento praguejava, amaldiçoando o animal e aos poucos ia deixando as tralhas pelo caminho, sem esquecer-se da recomendação do rei: - Cuida do mais importante.
Devido às péssimas condições, o caminhar tornou-se curto e lento e as paradas para descanso cada vez mais longas e frequentes. Percebendo o seu estado lastimável, escondeu as pedras no salto das botas para não ser assaltado e caiu exausto no meio do pó da estrada. Ficou desacordado por um longo tempo até ser encontrado por uma caravana de mercadores que dirigia-se ao seu reino. Assim, a caravana cuidou dele até recobrar os sentidos.
Ao retornar para casa imediatamente foi falar com o rei e contar o que havia acontecido atribuindo toda a culpa e o insucesso da operação devido às condições do cavalo.
- Majestade conforme recomendaste aqui está às pedras que me confiaste.
- Estão todas aqui e não perdi nem uma sequer.
O rei as recebeu com tristeza e o despediu decepcionado com a sua frieza.
Muito abatido, o jovem deixou o palácio e em casa ao tirar a roupa suja, encontrou na bainha da calça a mensagem lacrada do rei que dizia:
- Ao meu irão, rei da terra do norte!
O jovem que te envio é candidato a casar com minha filha e esta jornada é uma prova. Dei a ele alguns diamantes, um bom cavalo e recomendei que cuidasse do mais importante. Faz este favor: verifica o estado em que chegou o animal. Se estiver forte e viçoso, saberei que o jovem é fiel e sabe reconhecer quem o auxilia na jornada. Porem se perder o animal e chegar apenas com as pedras, sabe-se que não será um bom marido e nem um grande rei, pois terá os olhos voltados ao tesouro, não dará importância à rainha e nem aos que o servem.
Na idade média a vassalagem e a suserania formavam o sistema sócio-econômico. Numa relação de reciprocidade os senhores feudais recebiam terras, objetos materiais ou até mesmo um castelo de seu suserano em troca da fidelidade absoluta e da proteção ao seu suserano. No intuito de selar esta união e torná-la pública, a igreja organizava algumas homenagens para comprovar os laços afetivos e socioeconômicos estabelecidos entre ambos.
Nesta época, o rei era o suserano com maior poder na Idade Média e seus vassalos eram os senhores feudais e os cavaleiros. Os quais também possuíam servos, formando extensos laços de vassalagem e compromissos na idade média. Desta forma nas guerras, milhares de guerreiros eram mobilizados em pouco tempo devido ao acordo estabelecido entre ambos, pelas redes organizadas para garantir a segurança dos feudos e do castelo do rei.
Na idade média os homens tinham sobre as mulheres uma visão dicotômica fundamentada nos dogmas da igreja católica: ao mesmo tempo em que as mulheres eram culpadas pelo pecado original, os homens reconheciam a Virgem Maria como mulher, a mãe do salvador. Este conceito dicotômico sobre o feminino encontra-se no cristianismo desde a sua consolidação, fundamentado numa doutrina ascética e repressora, “[...] como reflexo das diversas ideologias presentes nos trezentos anos que levou para se estabelecer.” (CARVALHO, 2010) Deste modo às mulheres eram consideradas pelo clero como criaturas débeis e suscetíveis às tentações do diabo pelas manifestações histéricas, provocadas muitas vezes pela desatenção masculina as suas necessidades sexuais e afetivas.
Assim, eram segregadas devido à possibilidade de relatar os fatos verídicos que ocorriam no casamento, por isso deveriam ficar sob a tutela masculina e ser tratada como loucas quando os homens fossem afrontados ou confrontados nas suas versões. Deste modo para garantir a manutenção da sociedade patriarcal e fixar o juízo moral, no século XIII os freis eram encarregados pela igreja de pregar verdades nas cidades e nas vilas, intimidando as mulheres com estórias religiosas, conscientizando-as sobre a importância do papel servil.
Nos sermões utilizavam a exempla, onde relatavam à estória ou a história de algumas santas e a vida de prostitutas arrependidas. Nos relatos constantemente resgatavam a estória do pecado original, destacando Eva como a mulher capaz de concentrar em si todos os vícios como a luxúria, a gula, a sensualidade e a sexualidade latente no seu jeito de ser.
A história sagrada conta que Eva induziu Adão a comer o fruto proibido e então Javé, “Deus expulsou o homem e colocou diante do jardim de Éden os querubins e a espada chamejante, para guardar o caminho da árvore da vida.”(GENESIS, 1990, p.17) A partir deste episódio os homens conheceram o bem e o mal: as mulheres pariram filhos, sentiram dores, conheceram o amor e a paixão, envolveram-se com outras pessoas e tiveram que aprender a organizar-se para cultivar o solo de modo que conseguissem sobreviver.
Nesta perspectiva, os homens foram multiplicando-se sobre a terra, geraram filhas e filhos. Porém, “quando os filhos de Deus viram que as filhas dos homens eram belas, e escolheram como esposas todas aquelas que lhes agradaram.” (GENESIS 1990, p.19) Javé enfureceu e trouxe o dilúvio para exterminar a terra , pois percebeu que a maldade e a corrupção estavam ali implantadas. Depois da catástrofe, fez algumas considerações e estabeleceu uma nova aliança com os descendentes de Noé, preservando os animais.
A vida seguiu seu curso natural e a concepção da mulher companheira, submissa foi sendo construída através dos séculos para manter o patriarcado no poder. Carvalho (2010) destaca a importância desta ideologia, pois fornecia segurança ao clero celibatário e legitimava a submissão feminina sufocando qualquer tentativa de subversão da ordem estabelecida pelos homens. E a mulher cabia apenas: obedecer, obedecer e obedecer. Apesar de ignoradas como seres humanos e lembradas apenas nas estórias infantis o tema que trata das mulheres é rico e merece ser estudado com mais profundidade.
Na antiguidade a escravidão era uma prática comum e as mulheres eram tratadas de forma insignificante. Na idade média esta relação foi substituída pela servidão, mantendo a maioria da população em condição de inferioridade, afastada do poder, da tomada de decisões, compromissadas em servir ao senhor feudal, que servia ao suserano, ou seja, ao rei.
Na idade média os castelos eram pequenas cidades protegidos por muros altos, tinham fossa para esgoto, sala de fiar para confecção de roupas, cozinha e oficinas. No final da idade média os exércitos usavam a pólvora para derrubar as muralhas e conquistar os reinos e feudos. O reino era mantido pelos casamentos arranjados e a preocupação maior era com a segurança pois o risco da fome estava sempre presente e era preciso ter alguém que sustentasse a família e cuidasse dos seus membros quando um dos conjugues faltasse. Assim, celebravam o casamento com cerimônias imponentes e ricos banquetes para selar o acordo.
As meninas da nobreza aprendiam com a mãe e as outras mulheres da família as formas de como organizar o castelo e comportar-se. “As filhas dos camponeses aprendiam desde pequenas a cozinhar, lavar roupa, limpar a casa e arrumar a cozinha.” (LIMA 2008, P. 102) Quando casavam o destino era morar na casa do noivo para ajudar nas tarefas.
Naquela época o acesso à leitura e a escrita era privilégio dos nobres e dos filhos de comerciantes, as meninas eram alfabetizadas na família ou estudavam em conventos e os meninos em seminários. “Naquele período histórico era muito comum as filhas dos nobres aprenderem a cantar e a tocar instrumentos musicais” (LIMA 2008, p. 104) para alegrar a casa e apresentar-se nos eventos festivos promovidos pela nobreza e pela burguesia.
Na família da idade média a autoridade na família era o pai. As suas ordens eram obedecidas por todos os filhos e pela esposa e quem o desobedecesse podia ser punido com castigos físicos. Os bebês dos nobres recebiam muita atenção e cuidado, contrário aos filhos dos camponeses pois as mães além de fazer as tarefas da casa tinham que trabalhar no campo para ajudar o marido, desta forma muito os irmãos menores eram cuidados pelos mais velhos.
A maioria das mulheres morria cedo devido as péssimas condições de vida, vítimas de doenças, de endemias e epidemias, pela falta de higiene e pelos inúmeros partos. Os camponeses passavam fome, viviam fedidos pois não tinham o hábito de tomar banho e quase não tinham o que vestir, deste modo o casamento era proibido entre ambos.
As mulheres nobres organizavam e administravam o castelo com a ajuda de outras serviçais. O trabalho das não pertencentes à nobreza era muito importante, quando solteiras ajudavam os pais e depois os maridos. “Trabalhavam na fiação da seda, na fabricação dos tecidos, como bordadeiras, peleiras, luveiras e botoeiras.” (LIMA 2008 P. 117) As mulheres mais fortes daquela época trabalhavam em atividades mais pesadas como: caldeireira, ferreira, fabricantes de faca, arame, lata e caneca. Atuavam como carpinteira, pedreira e artesã de vidro. açougueira, salsicheira, padeira, leiteira, peixeira, forneira e queijeira. Muitas delas dedicavam-se a compra e a venda além de ajudar no plantio e na colheita dos produtos.
Na idade média, poucas mulheres tiveram a sorte da filha do rei na estória. No contexto a luta das mulheres pela liberdade e pela autonomia, mesmo de forma silenciosa vem agregando cada vez mais valor à questão de gênero, emponderando-as pelo acesso ao saber.
O trabalho fundamenta-se em diversos autores e tem como objetivo levar as pessoas a refletir sobre a influência do poder na violência contra a mulher pois percebe-se que desde o inicio dos tempos até a conquista da cidadania no século XXI o sistema patriarcal prevalece sobre a vida das mulheres. O artigo segue as normas da ABNT (2005) e justifica-se pela necessidade que temos em conscientizar as pessoas sobre a importância da cidadania na vida do ser humano. Sejam homens ou mulheres, ricos ou pobres, negros ou brancos, ateus ou não, o direito a liberdade é de fundamental importância para a convivência saudável.
Neste contexto marcado pela violência de toda ordem, percebe-se que é preciso divulgar estas idéias, escrever e promover a reflexão sobre o tema com acessibilidade na diversidade. Favorecer informações e conhecimentos que induzam as pessoas a pensar sobre a existência, para que possam melhorar-se como seres humanos, pois a violência é uma forma de poder, uma manifestação repugnante onde as mulheres são humilhadas e desvalorizadas.
No artigo utiliza-se como metodologia a investigação-ação, fundamentada em Carr y Kemmis (1988). Este método contempla um conjunto de regras e procedimentos que possibilitam realizar uma pesquisa de forma livre e continuada. O aprender a aprender gera uma ansiedade natural nas pessoas, para transformar este sofrimento do aprender em prazer é que trabalha-se de forma lúdica recreativa e sistematizada, lançando a seguinte questão:
- A violência contra a mulher é um problema contextual ou o resultado de um processo sócio-histórico-cultural?
1.1 O Poder e as Mulheres
O processo de instauração do patriarcado teve inicio no ano 3100 a.c. e só consolidou-se no ano 600 a.c. (SAFFIOTI, 2007, p.60) A medida que as pessoas passaram a viver em comunidades, deixando a vida isolada de clãs e tribos nômades, “para fixar e compartilhar terras, crenças e costumes, formando cidades, tornou-se necessário criar formas de tomar decisões sobre as questões que afetavam toda a coletividade e não apenas alguns de seus membros.” (GONZÁLEZ 2010, p. 19) A força e a barbárie foram substituídas pelas decisões tomadas na comunidade, que associavam as idéias para poder sobreviver.
O poder nas comunidades manifestava-se pelos interesses das pessoas ou de grupos. Desta forma os indivíduos eram submetidos às decisões tomadas pelo chefe da comunidade ou pelo grupo dominante de acordo com os princípios e valores. A conquista do poder dava-se de diversas formas: pela bravura, pela experiência ou pela proximidade com os deuses.
Da antiguidade até pouco tempo atrás a atividade política era considerada uma atividade masculina, mesmo no período em que a cidade grega de Atenas teve um governo democrático entre os séculos V e II a.c. onde “as mulheres estavam alijadas do processo.” (GONZÀLEZ 2010, p. 19)Deste período até os dias de hoje as mulheres sofreram longas e duras penas, sofreram em silencio, porem no século XX conseguiram garantir os direitos políticos. Agora podem votar e ser votadas para cargos de governo e defender suas causas.
Convêm lembrar que no mundo moderno a relação de servidão da idade média foi rompida, mas retoma-se a escravidão pela exploração econômica e o preconceito não apenas racial. Deste modo, novamente as mulheres são as principais vítimas do sistema patriarcal.
Nos anos 30 as mulheres conseguiram votar, nos anos 50 e 60 as revistas femininas induziam as mulheres a manter um comportamento dócil e pacífico para manter o patriarcado no poder. O Jornal das Moças aconselhava as mulheres a vestir-se depois de casada com a mesma elegância de solteira, lembrando que é preciso manter a caça presa. Sugeria: não irritar os homens com ciúmes e dúvidas, mas conquistá-lo com carinho e afeto. Alertava a mulher que espera-se o marido sempre linda, perfumada e dócil mesmo que este chegasse de madrugada e recomendava manter a casa sempre arrumada. Destacava que o lugar da mulher é no lar pois o trabalho realizado fora masculiniza e poderia ficar sem o afeto do marido.
No exemplo acima fica bem claro a presença do sistema patriarcal. Até pouco tempo atrás, na família patriarcal o homem tinha o domínio sobre a mulher e os filhos, porem devia submeter-se aos limites e ritos que a tradição determinava. Tinha o compromisso de desenvolver o patrimonialismo e a mulher deveria colaborar, economizar para aumentar os seus bens. No sistema patrimonialista o patriarca detinha o poder legítimo sobre os bens da família, “ [...] transladada para a formação política dos estados, em que o rei é aceito como dono, pessoalmente, de todos os bens do estado.” (GONZÁLEZ 2010, p. 23) Assim os bens públicos e privados diziam respeito ao governante e não apenas ao patrimônio individual.
O advento da democracia tornou este modelo anacrônico e ampliou os direitos políticos aos cidadãos. Atualmente, as mulheres não têm mais que preocupar-se em ajudar a aumentar o patrimônio do marido, mas cuidar da sua vida pessoal e profissional pois não segue-se mais a tradição, os ritos e os dogmas determinados por esta ou aquela religião.
Atualmente o exercício do poder administrativo estatal é regulado pela Constituição Federal e pelas leis, contrário ao principio da atividade privada, portanto [...] “ em que tudo que não for vedado pela lei é permitido, a legalidade da administração pública limita os atos apenas ao que for autorizado pela lei.” (GONZÁLEZ, p. 25) Assim, a lei como fundamento de legitimidade transferiu ao estado o poder de definir o que é e o que não é permitido.
No sistema democrático as mulheres adquiriram o direito de ser elas mesmas e a liberdade de manifestar as suas vontades, portanto o sistema é considerado um grande avanço social. Na antiga ordem o governante e o patriarca tinham como limites, o compromisso de seguir os costumes e a tradição. Atualmente o limite é definido pelo que determina a lei, de fundamental importância para quem as faz e quem as executa no exercício da cidadania.
Neste processo o estado assumiu a responsabilidade de garantir a pacificação das relações e a regulação do conflito entre os indivíduos no contexto por meio de programas e projetos sociais. Na segurança, o uso da violência para garantir os seus objetivos passa a ser exclusivo do estado e dos seus agentes conforme determina a lei. Mais uma vitória, pela primeira vez na historia da humanidade as mulheres tem liberdade para participar de forma democrática na organização e na aprovação de propostas que contemplam seus interesses.
1.2 As Mulheres e a nova ordem social
Neste século a nova ordem mundial visa à inclusão social, para isso respeita a diversidade de idéias e interesses de todas as pessoas, portanto “o respeito à ordem pode vir também de crenças religiosas ou do seguimento de valores tradicionais.” (GONZÁLEZ 2010, p. 27) Aceitar a legitimidade da nova ordem e das leis envolve um processo de conscientização social pois todas as tendências e tipos humanos devem ser contemplados.
O Código Civil Brasileiro disciplina as relações jurídicas de direito privado. Regula as relações entre particulares regulamentando os direito e deveres de todas as pessoas e regendo suas relações obrigacionais, patrimoniais e familiares. Sendo assim toda pessoa é dotada de personalidade, seja a pessoa natural (ser humano) ou pessoa jurídica (entidades morais).
Neste contexto o único ser humano capaz de gerar vida e dotar alguém de personalidade civil continua sendo a mulher. De acordo com o art.2º do Código Civil 2002 a personalidade civil inicia-se com o nascimento com vida e a lei põe a salvo os direitos do nascituro desde a sua concepção. O nascimento ocorre quando o feto é separado do ventre materno e “ao respirar, viveu afirmando-se a sua personalidade civil.” (BARROS e AGUIRRE 2009, p.24) Deste modo ao nascer à criança adquire direito a vida, a integridade física, a alimentos, o direito de ser reconhecido como filho ou o direito de ser adotado. Pode ser contemplado em testamento ou receber doações como outra pessoa qualquer e não é mais obrigado a renunciar aos bens em favor do primogênito como em sociedades ultrapassadas.
Vive-se num estado democrático de direito que requer uma mudança de paradigma pessoal e social para uma convivência saudável. Um re-pensar social, neste modelo prevalece à análise racional de custo/benefício, enfraquece a legitimidade das instituições legais e avalia a vantagem/desvantagem, ou seja, a probabilidade de punição pela falta e não como o descumprimento de um princípio de fundamento ético no qual se crê como válido.
Isso não quer dizer que os princípios e os valores pessoais não devam ser respeitados, bem ao contrário, estes devem ser escutados e avaliados na busca do entendimento entre as partes. A nova ordem social prima pela convivência pacífica e para isso faz-se necessário o respeito à diversidade Nesta proposta estimula-se o diálogo para que as pessoas consigam entender-se e chegar a um denominador comum respeitando a diversidade cultural.
Sendo assim, uma das formas de manter a legitimidade das instituições é [...]” valorizar a sua construção por meio de um processo democrático como fonte de legitimidade do exercício dos poderes do estado.” (GONZÁLEZ 2010, p. 27) Nesta perspectiva é de fundamental importância envolver as pessoas no processo de humanização e emancipação.
No contexto nem sempre a palavra cidadania está clara e as pessoas desconhecem [...] “as possibilidades de ação, mudança e aperfeiçoamento que o exercício dos mesmos pode acrescentar na vida coletiva e individual.” (ROCHA 2010, p. 35) A cidadania é garantida por lei e requer a participação ativa do cidadão, independente do gênero na condução dos interesses da coletividade em diversos níveis e processos de representação democrática.
A cidadania está relacionada à existência e à força do estado, [...] pois decorre da lei e a ordem social e todos os direitos e deveres daqueles que são o objeto e o sentido da ação do estado: os cidadãos. (ROCHA 2010, p.35) Considera-se cidadão aquele que participa nas discussões e deliberações na sociedade e tem o direito de ouvir, falar e votar em igualdade aos demais cidadãos, independente da classe social, do gênero, da etnia ou opção religiosa.
A afirmação atual sobre cidadania diz que todos os indivíduos ou pessoas possuem direitos, principalmente a liberdade e a igualdade. Esta postura contraria antigas concepções. Antigamente, a elite entitulava-se: “cidadãos”, e a partir disso tinham os direitos adquiridos pelo status. Atualmente a cidadania estende-se a todas as pessoas desde que tenham nascido com vida e resulta na capacidade de ter direitos adquiridos e deveres a cumprir na sociedade.
No inicio do século XX com a entrada do Estado Social, ou Estado de Bem-Estar as leis vem sendo modificadas e tanto as mulheres como os homens foram beneficiados com a Lei Maria da Penha que visa intimidar a violência doméstica. Em função deste movimento social que prima pela igualdade entre homens e mulheres [...] “o estado já começou a dotar os direitos sociais, e começa a impor esses direitos em toda a sociedade, “normalizando-os.” (ROCHA 2010, p. 38) Para facilitar a vida e o processo de convivência entre as pessoas.
No Direito brasileiro, o conceito de cidadania está ligado à condição de morador da cidade e do país desde que comprovem residência fixa e vínculo afetivo. Na nova ordem social a democracia e o exercício da cidadania tornam-se fundamental para a inclusão de homens e mulheres, de modo que aprendam a aprender, a fazer, a viver e a conviver em ambientes humanizados e de forma saudável ao invés de participar de ambientes conflituosos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A violência contra a mulher é um problema sócio histórico e cultural manifestas por pessoas insensíveis ao ser humano na sociedade. Percebe-se que apesar da evolução sócio-econômica e tecnológica o ser humano avançou muito pouco na questão de gênero e no processo de humanização e a emancipação pois ainda rotulam as mulheres com santas ou loucas quando buscam suas verdades, desrespeitando-as na condição de cidadã. Atributos que de forma inconsciente relembram a exempla, onde mostrava-se a figura de Maria Madalena como a mulher que havia submetido-se aos homens e a Igreja.
Desta forma percebe-se que as concepções clericais medievais continuam presentes na sociedade atual. Apesar de toda a liberdade, ainda as mulheres continuam a ser ofendidas e violentadas devido a estereótipos e preconceitos. O sistema democrático e a nova ordem primam pela inclusão social com respeito à diversidade, isto não dá o direito de ignorar valores e princípios voltados a uma ética cristã, valendo-se da promiscuidade e da barbárie.
Na idade média os cristãos mobilizavam milhares de guerreiros, para combater os muçulmanos na Terra Santa, graças às inúmeras relações de vassalagem e suserania que existiam na Europa Medieval. Neste período milhares de pessoas foram mortas ou vendidas como escravos, inclusive mulheres e crianças. Embora não muito bem sucedidas, as cruzadas na idade média incrementaram o comércio e a cultura pela troca de favores, comum entre os suceranos e os vassalos. Introduziram novas idéias na Europa, pois os sarracenos eram profundos conhecedores de Matemática, da Medicina e da Astronomia.
Respondendo a pergunta do artigo, percebe-se que a violência contra a mulher não é apenas um problema contextual, mas resultado de um processo sócio-histórico-cultural que alastra-se pelo tempo. Para responder a questão resgatar a historia da humanidade foi de fundamental importância para perceber o quanto o poder influi na violência contra a mulher.
Acredita-se que o artigo produz resultados significativos, leva as pessoas a pensar sobre o contexto e analisar com cuidado a influencia do poder institucionalizado na violência contra as mulheres. Na revisão bibliográfica percebe-se claramente a influencia do poder patriarcal sobre a mulher, intimidando-a pela falta de acesso a educação, ao saber, ao trabalho, ao emprego e a renda diminuindo o seu potencial e acentuando as dificuldades, anulando-a.
O sistema democrático encontra-se em aprimoramento no mundo e requer cidadãos cada vez mais preparados e habilitados para construir a sociedade de forma coletiva. De modo que o poder não fique restrito aos representantes legais, mas não mão de cada cidadão para que lute pelos seus interesses, independente do gênero, da classe social, etnia ou culto religioso para que sejam felizes e consigam conviver em harmonia com os demais.
Percebe-se que o patriarcado começou a ruir, porem os seus alicerces ainda estão muito presentes na sociedade contemporânea. Acredita-se que o objetivo foi alcançado, o artigo instiga o leitor a perceber a importância do poder da herança grega no desenvolvimento da civilização ocidental e na democracia, bem como as valiosas contribuições da idade média no mundo do trabalho. Originando atualmente uma nova ideologia voltada à inclusão social, que requer uma democracia efetiva e o exercício da cidadania para existir. Constata-se que o poder origina-se do conhecimento e ajuda a organizar estratégias para alcançar os objetivos.
Conclui-se que, apesar do sistema ser racional, sistemático e organizado voltado ao masculino. O novo paradigma necessita da empatia do poder feminino para favorecer uma vida e uma convivência saudável entre homens e mulheres. Requer acesso ao saber para que as pessoas descubram os princípios e os valores para uma nova ética pois faz pouco tempo que as mulheres são consideradas seres humanos, livres e iguais na condição de direitos.
Vive-se um novo paradigma recheado de surpresas e desafios que deve estender-se no tempo. Nesta perspectiva espera-se que as mulheres consigam superar-se, transformar o mundo com criatividade e alegria, resgatando a auto-estima e a beleza da vida, valorizando a sensibilidade e os tipos de inteligências, favorecendo a humanização e a emancipação entre os homens e as mulheres. Espera-se que as mulheres consigam libertar-se das amarras pois nesta nova era não queremos mais ser a companheira, mas a parceira para todas as horas e ser feliz.
- Portanto, nos respeitem!
- E agora! Mãos a obra, que o mundo é nosso!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS A. e AGUIRRE, J. DIREITO CIVIL. 3ª ed. Rev. E atual. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. (Elementos do Direito, v. 4)
CARR, W e KEMMIS, S. TEORIA CRÍTICA DE LA ENSEÑANZA: Investigación-accion en laFormación del Professorado. Barcelona: Martinez Roca. 1988.
CARVALHO F. A MULHER NA IDADE MÉDIA: a construção de um modelo de submissão. Disponível: http://www.ifcs.ufrj.br/~frazao/mulher.html Acesso em 21 agosto 2010.
DUBY, G. e PERROT, M. (dir.) HISTÓRIA DAS MULHERES: a Idade Média. Porto: Afrontamento. 1990.
ESTRUTURA E APRESENTAÇÃO DE MONOGRAFIAS, DISERTAÇÕES E TESES: MDT/ Universidade Federal de Santa Maria, Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa. 6 ed. Ver. E ampl – Santa Maria: Ed. Da UFSM, 2006.
GENESIS. BÍBLIA SAGRADA. São Paulo: Sociedade Bíblica católica internacional e Paulus. Edição Pastoral. 1990.
GONZÁLEZ, R. O PODER E SUAS FORMAS. In Curso formação de Agentes de Cidadania. POA: Fundação Ulysses Guimarães Nacional. 2010.
JORNAL DAS MOÇAS. Disponível em: http://apapoilitacoquelicot.blogspot.com/2007/06/jornal-das-moas.html. Acesso em 20/08/2010
LIMA, M. HISTÓRIA – Série Brasil. São Paulo: Ed. Ativa, 2ª Ed. 2008.
ROCHA, A. AS DIMENSÕES DA CIDADANIA. In Curso formação de Agentes de Cidadania. Porto Alegre: Fundação Ulysses Guimarães Nacional. 2010.
SAFFIOTI, H. GÊNERO, PATRIARCADO, VIOLÊNCIA. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2004. (Coleção Brasil Urgente)
[1] Liz Helena Pigatto atua como advogada. Presidente do Rotaract Clube Jovem e membro da Cátedra de Gênero Wilma Roberts na cidade de Santa Maria RS.
[2] Lisete Maria Massulini Pigatto é Drª em Ciências da Educação, atua como Educadora Especial no sistema estadual e municipal de ensino na cidade Santa Maria, RS e membro da Cátedra de Gênero Wilma Roberts.
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